Cirurgias Reparadoras Após Bariátrica: Direito do Paciente e Ilegalidade da Recusa por Planos de Saúde e SUS
Resumo
As cirurgias reparadoras pós-bariátricas têm caráter funcional e psicológico, sendo parte integrante do tratamento da obesidade mórbida. Contudo, pacientes enfrentam negativas recorrentes por planos de saúde e, em certos casos, pelo SUS. Este artigo analisa a legalidade dessas negativas à luz da jurisprudência, da legislação vigente e dos direitos fundamentais à saúde e à dignidade humana.
1. Introdução
A cirurgia bariátrica tem se consolidado como importante intervenção no tratamento da obesidade severa e de suas comorbidades. No entanto, o tratamento não se encerra com a redução do peso: o excesso de pele decorrente da perda maciça compromete a saúde física e psicológica dos pacientes, demandando cirurgias reparadoras.
Negativas recorrentes por parte de operadoras de planos de saúde e até da rede pública ensejam graves violações de direitos. A questão central é: é legal a recusa à cirurgia reparadora? Este artigo responde negativamente, com base no ordenamento jurídico e na jurisprudência pátria.
2. Fundamentação Jurídica: A Saúde como Direito Fundamental
O artigo 6º da Constituição Federal de 1988 estabelece a saúde como direito social. Já o artigo 196 dispõe que:
“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos.”
A jurisprudência tem compreendido que o direito à saúde não pode ser fragmentado. Assim, a cirurgia reparadora não é um procedimento estético, mas complementar ao tratamento bariátrico, tendo caráter funcional e terapêutico.
3. A Recusa do Plano de Saúde: Cláusulas Abusivas e CDC
Nos casos em que planos de saúde recusam cobrir cirurgias reparadoras, frequentemente se alegam cláusulas contratuais de exclusão de procedimentos com finalidade estética. No entanto, a jurisprudência dominante considera tais cláusulas abusivas, à luz do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor:
“São nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas […] que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.”
📌 Exemplo de jurisprudência (TJSP, Apelação Cível 101XXXX-XX.2023.8.26.0000):
“A recusa do plano de saúde em custear cirurgia plástica reparadora após procedimento bariátrico, necessária para remoção de excesso de pele que compromete a saúde da paciente, configura conduta abusiva. O caráter reparador e funcional do procedimento afasta a alegação de estética.”
4. SUS e Cirurgias Reparadoras: Obrigação do Estado
Embora o Sistema Único de Saúde (SUS) possua recursos limitados, existe diretriz normativa para cobertura de cirurgias plásticas reparadoras, como a Portaria nº 492/2007 do Ministério da Saúde, que inclui tais procedimentos no rol de cirurgias autorizadas após a bariátrica.
Além disso, o Judiciário tem reconhecido a responsabilidade do Estado em garantir o procedimento, sob pena de violação aos princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e da integralidade do tratamento (art. 7º, II da Lei 8.080/1990).
5. Danos Morais em Casos de Recusa Indevida
A recusa injustificada, tanto por planos quanto pelo Estado, pode gerar danos morais. Isso porque o paciente, já fragilizado física e psicologicamente, é obrigado a judicializar um direito que lhe é constitucionalmente assegurado.
📌 TJRS, Apelação Cível nº 700XXXX-XX.2022.8.21.7000:
“O sofrimento psicológico causado pela negativa abusiva de cirurgia reparadora enseja indenização por danos morais. Valor fixado em R$ 10.000,00.”
6. Conclusão
As cirurgias reparadoras após a cirurgia bariátrica não configuram luxo ou vaidade, mas sim complemento essencial ao tratamento médico e psicológico da obesidade mórbida. Tanto o plano de saúde quanto o SUS têm o dever de garantir esses procedimentos.
Dessa forma, a recusa à cirurgia reparadora, quando clinicamente indicada, é ilegal, abusiva e passível de reparação judicial, inclusive com indenização por danos morais. O paciente deve ser orientado a buscar judicialmente seus direitos, respaldado na legislação protetiva e na jurisprudência consolidada.