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Mounjaro: entre a ciência e o direito no acesso a medicamentos inovadores.

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O medicamento Mounjaro (tirzepatida), aprovado pela Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos para o tratamento do diabetes tipo 2, tem ganhado notoriedade no Brasil não apenas pelos seus efeitos glicêmicos, mas também pelo seu potencial emagrecedor. Após relatos de celebridades e influenciadores que utilizam a substância para fins estéticos, o debate sobre o uso off-label e o acesso a medicamentos inovadores reacendeu não apenas entre profissionais da saúde, mas também no meio jurídico.

Do ponto de vista científico, a tirzepatida é uma molécula que atua como agonista duplo dos receptores GLP-1 (peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1) e GIP (polipeptídeo inibidor gástrico), promovendo a redução da glicose no sangue, melhora da sensibilidade à insulina e redução significativa do peso corporal. Estudos clínicos, como os publicados no New England Journal of Medicine, demonstram que pacientes tratados com Mounjaro perderam entre 15% e 22% de seu peso corporal total — índices superiores à maioria dos medicamentos atualmente disponíveis para obesidade.

Entretanto, no Brasil, a tirzepatida ainda não foi aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para uso comercial, embora existam pedidos de importação com base em prescrição médica personalizada. Nesses casos, o medicamento pode ser adquirido por meio de importação direta por pessoa física, com amparo na RDC nº 660/2022, que regula o processo de importação excepcional de produtos sem registro no país.

Essa situação levanta relevantes questões jurídicas e constitucionais, sobretudo à luz do direito à saúde previsto no artigo 6º e no artigo 196 da Constituição Federal. Quando um médico prescreve um medicamento essencial para o tratamento de um paciente – mesmo que este não possua registro na Anvisa, mas tenha aprovação internacional reconhecida – o Estado pode ser compelido a garantir seu fornecimento, conforme jurisprudência consolidada nos tribunais superiores.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou sobre o tema em diversos precedentes, permitindo a concessão de medicamentos não registrados, desde que atendidos requisitos objetivos, como: (i) inexistência de alternativa terapêutica disponível no SUS; (ii) registro do medicamento em agências reguladoras internacionais de referência, como a FDA ou EMA; e (iii) laudo médico justificando a prescrição. A tese foi firmada no Tema 106 do STJ, que continua sendo base para decisões em todo o país.

Contudo, o uso off-label para emagrecimento — ou seja, quando o medicamento é prescrito para finalidades diferentes daquelas autorizadas — impõe limites éticos e regulatórios. O Conselho Federal de Medicina (CFM) autoriza o uso off-label, desde que baseado em evidência científica robusta e devidamente justificado no prontuário médico. A ausência de respaldo técnico-científico pode configurar infração ética e até implicar responsabilidade civil.

Portanto, o caso do Mounjaro exemplifica o embate contemporâneo entre avanços da ciência, limites regulatórios e garantias fundamentais do paciente. Cabe ao profissional jurídico, em conjunto com a equipe médica, orientar o paciente quanto aos seus direitos, seja no acesso via importação, seja em ações judiciais que busquem o fornecimento gratuito do medicamento, quando comprovada a sua essencialidade.

Diante da crescente busca por medicamentos inovadores, como o Mounjaro, é imprescindível que o debate jurídico acompanhe os avanços da ciência, garantindo que o direito à saúde não seja ofuscado por burocracias ou omissões do Estado.


Dr. Vladimir Saboia
Advogado | Especialista em Direito da Saúde e Acesso a Medicamentos
vladimirsaboia.blog.br | @dr.vladimirsaboia

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